Catadores retiram materiais recicláveis do aterro sem o uso de luvas, máscaras e botasFoto: Werinton Kermes |
A reportagem publicada na edição da Gazeta de Votorantim do último sábado (1º), denunciando a presença de cerca de 70 pessoas, inclusive muitas crianças, em condições desumanas no Aterro Sanitário Municipal de Votorantim, repercutiu na última sessão da Câmara Municipal de Votorantim. Alguns legisladores aproveitaram a palavra livre para comentar sobre o tema. O vereador Joãozinho de Queiroz (PT) questionou se o município está cumprindo algumas regras que ele mesmo estabeleceu em relação a quantidade de lixo enviada ao aterro. “Precisamos refletir sobre as questões relacionadas à geração de lixo, reciclagem, consumo, desemprego e o aterro. O aterro sanitário era para durar 30 anos, mas a Prefeitura teria que fazer a reciclagem de todo o material reciclável e, além disso, tirar outros materiais inertes para não prejudicar a vida útil do aterro. Esta Casa de Leis poderia pegar a matéria sobre a visita dos vereadores ao aterro e levar ao Ministério Público, para que se cobre do Poder Público uma providência. Temos que fazer, também, com que se cumpra as regras com relação à produção, distribuição de material e consumo, pois as indústrias também são responsáveis pelo lixo. Em relação aos catadores, posso dizer que não moramos em um pais pobre, sem energia, por exemplo, o que ocorre, é que moramos em um pais desigual”, disse.
O vereador Bruno Martins (PSDB) disse que há anos que existe a presença de catadores no local, justificando que é difícil controlar o acesso das pessoas ao local e atribuiu a elas a responsabilidade de estarem lá. “É difícil pedir para elas mudarem de trabalho. Não é uma situação fácil, porque as pessoas que estão lá, estão de livre e espontânea vontade, não tiveram oportunidades, mas quem somos nós para condená-las, tentar barrá-las, elas estão lá tirando seu pão de cada dia. Estão no destino final, onde o cheiro é maior, mas eles estão lá”, afirmou lembrando que já esteve no aterro.
Um dos vereadores a fazer parte da comitiva, Eric Romero (PPS) ressaltou que o objetivo da visita não foi para prejudicar as pessoas e sim ajudá-las. Ele também afirmou estar preocupado com a situação que encontrou classificada por ele como desumana. Ele defende uma política para dar a eles melhor condição de trabalho e a retomada das cooperativas. “Vi famílias ali, é algo que nos assustou e nos preocupa”, diz. “Alguns pediram nossa ajuda para poder adentrar ao recinto mais cedo, mas não é esse o papel do poder público e sobretudo daqueles que tem condições de fazer algo para mudar as vida das pessoas. Acho que estamos aqui para isto. Precisamos desenvolver uma política, dando a eles melhores condições de trabalho, um espaço para eles trabalharem, a retomada das cooperativas nos diversos pontos da cidade, a conscientização da população é o melhor parceiro nesse processo”. “Longe de nós prejudicarmos aquelas pessoas, pelo contrário, nós fomos lá para ajudá-las, embora possamos em determinados momentos ser mal interpretados, mas nosso objetivo foi de foi lá para ajudar e é o que vamos tentar fazer dentro das nossas possibilidades”, completa.
O tucano Pastor Tonhão ressaltou a questão da conscientização da sociedade. “É triste, mas a culpa é de quem? Jogamos a culpa no poder público, mas na verdade todos nós somos culpados, pois não separamos nosso lixo reciclável. Inclusive, nos bairros aumentou o número de pessoas que passam revirando os lixos”, comentou.
Marcão Papeleiro (PT) citou as cooperativas de reciclagem. Ele criticou o atual mandato, afirmando que houve falha na questão da manutenção e ampliação da cooperativa, questionando os investimentos do poder público na coleta seletiva. “Esse mandato falhou. Os mandatos anteriores criaram uma cooperativa. O que eles fizeram pela cooperativa? O que fizeram para ampliar a cooperativa para que essas pessoas não ficassem nessas condições? Qual o investimento que o Poder Público atual fez em relação ao aterro sanitário ou a questão da coleta seletiva”, questiona. “Se ampliassem, talvez criasse a cultura de separar os materiais, como se criou em vários bairros”, completa.
O que diz a Prefeitura
O papel da Cooperativa dos Catadores de Material Reciclável de Votorantim (Coopervot) e o suporte que a Prefeitura dá para a mesma foi um dos pontos mais citados pelos vereadores, tanto durante a visita semana passada, quando na sessão de terça-feira.
Procurado por nossa reportagem, o secretário municipal do Meio Ambiente, Carlos Alberto Leite, disse que a cooperativa é organizada por pessoas autônomas com o objetivo de fazer a coleta seletiva da cidade, tendo CNJP próprio e não cabe ao Paço fazer investimento nela. “Tudo que vem do lucro é dividido entre os próprios funcionários. Ela é tida como empresa particular”, diz.
Ele explica ainda que a Prefeitura tem convênio com a cooperativa ao qual ela dá suporte para que ela trabalhe. Ele ressalta que a mesma funciona em uma área pública, cedida pela Prefeitura, que arca com as despesas de água e luz e que manutenção e o combustível dos dois caminhões emprestados aos 38 cooperados também são custeadas pelo poder público.
“Então como falar que não tem aporte da Prefeitura lá?”, indaga. “A Prefeitura dá o suporte que é necessário para que essa cooperativa, com o número de funcionários que ela tem, trabalhe em uma determinada área da cidade. Hoje ela atinge em torno de 60% dos bairros com a coleta seletiva, toda ela aparada por apoio da Prefeitura”, diz.
Questionado se a Prefeitura poderia ajudar financeiramente, o secretário disse que o poder público não pode fazer determinado tipo de aportes para organizações sem que seja tudo documentado ou conveniado e que estão trabalhando para ampliar o trabalho da coleta seletiva de forma licita, com convênio entre a cooperativa e a Prefeitura e está faltando documentação por parte da Coopervot para esse convênio ser efetivado. Ele lembra que a Prefeitura trabalha na ampliação da coleta seletiva e que irá oferecer um novo galpão e mais um caminhão para assim ela poder ampliar o número de cooperados. No entanto, o secretário não estipulou um prazo para isso.
Sobre como a Cooperativa pode auxiliar os trabalhadores que trabalham no Aterro Sanitário, o secretário explicou que os interessados devem procurar a Cooperativa, preencher o cadastro e aguardar ser chamado, uma vez que a Coopervot comporta um número limitado de trabalhadores.
O papel da cooperativa
O gestor ambiental Edson Locatelli há 15 anos trabalha com os catadores de materiais recicláveis de Votorantim e atualmente é voluntário da Coopervot. Ele explicou a origem da cooperativa. “Começamos o trabalho de retirada dos catadores do lixão em 2000, na ocasião tinham mais de 70 famílias atuando no local, inclusive muitos moravam lá e se alimentavam de restos de alimentos. A cooperativa teve início nesse momento. Em 2010 saíram todos os catadores do lixão e criou-se o aterro sanitário, e não ficaram mais pessoas atuando no local, sendo que a coleta seletiva passou a ser realizada de maneira ampla, cobrindo toda a cidade”.
De acordo com ele, nos últimos anos a situação se reverteu. “Não há coleta de lixo em toda a cidade e não há impedimento da entrada do catadores no aterro. Hoje, somente 50% dos bairros da cidade recebe a coleta seletiva. Não há investimento na coleta seletiva na cidade. De acordo com um levantamento que realizei, necessitaria de R$ 1,5 milhão a R$ 2 milhões para realizar a coleta seletiva em toda a cidade, com um novo barracão, seis caminhões e equipamentos”, estimou. “O único investimento que teve foi na época da criação da cooperativa com a construção de dois barracões. De lá para cá, houve investimentos pontuais. Um dos caminhões veio em 2000 de um deputado federal e o outro foi decorrente do programa município VerdeAzul”, salientou.
Locatelli, analisa a situação sob vários ângulos, do econômico ao social. “Hoje, 26 toneladas de lixo reciclável são encaminhados ao aterro sanitário, o que gera custos para aterrá-lo. Estamos aterrando dinheiro, sem contar que estamos perdendo em vida útil do aterro. A cooperativa coleta cerca de 130 toneladas de materiais recicláveis, gerando por mês um faturamento de R$ 45 mil. Cada catador recebe R$ 1200,00 por mês, não dependendo de doação de alimentos e solidariedade de ninguém”, afirmou.
Sobre o fato da Cooperativa ser um órgão autônomo, Locatelli salienta que a Cooperativa sempre busca outras parcerias, e diz que o benefício do trabalho realizado pelos cooperados favorece diretamente a municipalidade. “O Instituto Coca-Cola firmou uma parceria conosco, cumprimos as metas, recebemos verba para comprar camisetas e recebemos concreto para concretar parte da nossa Cooperativa. Em 2013 ganhamos o prêmio EcoPET na cidade de São Paulo, onde ficamos em segundo lugar. Mas precisamos de mais investimentos, pois trata-se de um trabalho em prol da sociedade que beneficia diretamente a Prefeitura, que deixa de realizar a coleta desse material”, finalizou.
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